Da Constituição Apostólica Divino aflatu, de São Pio X, papa
(AAS3[1911],633-635)
(Séc.XX)
A voz da Igreja que canta suavemente
Compostos por divina inspiração, os salmos colecionados na Sagrada Escritura foram desde os
inícios da Igreja empregados, como se sabe, não apenas para alimentar maravilhosamente a
piedade dos fiéis que ofereciam sempre a Deus o sacrifício de louvor, isto é, o fruto dos lábios
que louvam seu nome (cf. Hb 13,15; Os 14,3); mas também, como já era costume na antiga Lei,
para ocupar lugar eminente na sagrada liturgia e no ofício divino. Daí nasceu, na expressão de
Basílio, “a voz da Igreja” e a salmodia. Salmodia que é “filha de sua hino dia, que sempre a
Igreja canta diante do trono de Deus e do Cordeiro”, como expõe nosso predecessor Urbano
VI. Assim a Igreja ensina aos homens particularmente devotados ao culto divino, conforme as
palavras de Atanásio, “de que modo se deve louvar o Senhor e com que palavras dignamente”
confessá-lo. A este respeito disse muito bem Agostinho:“Para ser bem louvado pelo homem,
Deus mesmo se louvou; e, aceitando louvar-se, deu ao homem encontrar o modo de louvá-lo”.
Além disto, nos salmos há uma maravilhosa força para despertar nos corações o desejo de todas
as virtudes. Pois, “embora toda a nossa Escritura, tanto a antiga quanto a nova, seja inspirada
por Deus e útil para a instrução, como está escrito (cf. 2Tm 3,16), o livro dos salmos porém,
semelhante a um paraíso, que contém em si os frutos dos demais livros, produz o canto, e, ainda
mais, oferece seus próprios frutos unidos aos dos outros durante a salmodia”. Essas palavras são
novamente de Atanásio, que acrescenta: “A mim me parece que os salmos são como um
espelho para quem salmodia, onde este se contempla a si e os movimentos de seu espírito, e,
assim impressionado, os recita”. Também diz Agostinho nas Confissões: “Como chorei por
causa de teus hinos e cânticos, vivamente comovido pelas suaves palavras do canto de tua
Igreja! As palavras fluíam em meus ouvidos e instilava-se a verdade em meu coração, fazendo
arder a piedade; corriam-me as lágrimas e sentia-me bem com elas”.
Na verdade, a quem não comovem aquelas freqüentes passagens dos salmos onde se canta
profundamente a imensa majestade de Deus, a onipotência, a indizível justiça,a bondade ou a
clemência e todos os outros infinitos louvores? A quem não inspiram iguais sentimentos as
ações de graças pelos benefícios recebidos de Deus, ou as humildes e confiantes preces pelo
que se deseja, ou os clamores do arrependimento dos pecados? A quem não inflama a
cuidadosamente velada imagem do Cristo Redentor “cuja voz ouvia Agostinho em todos os
salmos a salmodiar, a gemer, a alegrar-se na esperança ou a suspirar pela realização?”
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