A força do chamado na vida dos profetas
A força do chamado na vida dos Profetas
A experiência do ser chamado é algo totalmente pessoal. Deus atinge a pessoa e ela não pode ficar calada (Jer 20, 7-18). Sua palavra cria situações novas às pessoas tocadas por ela. É tão profunda a ruptura que realizamos profecias com sua vida anterior, que nenhuma das vinculações sociais precedentes passa à sua nova existência. “Eu era Pastor e cultivador de figos..., mas o Senhor me agarrou” (Am 7,14). Trata-se de algo mais que nova profissão; trata-se de nova situação vital. O eleito e chamado é arrancado da sociedade e de suas seguranças econômicas e sociais e é introduzido numa situação de dependência do Senhor, privada de toda segurança: “nunca me sentei em companhia de gente alegre para me divertir.
Por causa de tua mão, assentei-me sozinho, pois tu me encheste de indignação...” (Crise vocacional de Jeremias- Jer 15, 10-21). Os profetas, homens de carne e osso, sentem-se sob um poder irresistível, que os violenta e força: “Tu me reduziste Senhor, e eu me deixei seduzir, sobrepujastes e me venceste” (Jer 20,7). Esses profetas são agarrados por Deus e da sacudidos em suas bases: “Rugindo o Leão, quem não temerá? Falando o Senhor, quem não profetizará” (Am 3,8).
a) - O Senhor me agarrou.
Amós era pastor e cultivador de figos (7,14). Vivia folgadamente no campo e Deus se interpôs em sua vida. “O Senhor me agarrou de trás do rebanho e me disse: Vai profetize a meu povo Israel” (Am 7,15).
Não se fica onde se quer, fica-se onde é ordenado ou onde se é enviado. A vocação é descobrir e reconhecer que o Senhor quer dispor da vida do homem para seus projetos. Assim, o chamado não vai onde quer e sim onde o Senhor envia. O chamado é obediente e enviado: não um boêmio e interessado que se filia a um “Modus Vivendi”. Amós foi a uma comunidade dividida entre uma classe alta, alegre e confiada, e outra explorada e humilhada. Denunciar a injustiça, defender os oprimidos, anunciar a conversão é o ministério de Amós.
b) - Vi o Senhor, ouvi Sua voz.
Isaías foi homem e a quem Deus chamou do ambiente urbano, Jerusalém, e da familiaridade com o culto desde pequeno. O Senhor procurou-o e o encontrou no Templo. Foi uma visão, que se transforma em audição e que culmina em conversão (Os 6, 15). Na raiz foi uma experiência ou vivência religiosa. O Senhor se apresenta em sua glória e majestade, presente em toda terra com seu esplendor. Isaías é atingido e toma consciência de si mesmo: “Ai de mim, estou perdido, eu homem de lábios impuros... contemplei a face de Deus”. A santidade de Deus faz o homem sentir sua impureza. Será purificado e perdoado. “Eu ouvi a voz do Senhor, que dizia: quem enviarei?... e respondi: Eis-me aqui envia-me a mim”. Abriu-se um diálogo. O homem pode apresentar-se e oferecer-se, mostrar-se disposto a quem pode unicamente enviá-lo. O chamado é deixar-se tomar e deixar-se enviar.
c) - Testemunha da ternura de Deus.
Deus chama Oséias, originário do Reino do Norte, para profetizar antes da queda da Somaria e lhe diz: “Vai e toma por mulher uma prostituta e gera filhos em prostituição, porque o país se prostituiu completamente, afastando-se do Senhor” (Os 1, 2b). Oséias testemunha o caminho maravilhoso que vai desde a miséria da Meretriz até às suas Bodas. No chamado de Oséias há uma história de ternura. A Palavra de Deus intervém na história humana para mudá-la. Deus fala primeiro a Oséias e depois mediante Oséias (Os 1, 1-2).
Isto quer dizer que ninguém pode falar em nome de Deus sem antes ouvir a Palavra de Deus. Todos aqueles que apresentam como Palavra de Deus aquilo que sonharam, pensaram ou imaginaram, a Bíblia os chama de falsos profetas.
Só aqueles que escutam a Deus, podem dizer dele a outros alguma coisa que mude o sentido e a direção da história. Oséias não foi chamado a viver nenhuma situação honrosa: casar-se com uma prostituta. Seu patrimônio, significaria o pecado - a prostituição - do povo; o esquecimento de Deus. “Corria atrás de seus amantes e esquecia-se de mim” (Os 2,15).
Atrás da figura do amante esconde-se hoje muitas outras formas de esquecimento.
d) - Senhor, não sei falar, sou jovem.
Jeremias foi chamado de uma aldeia próxima de Jerusalém. A idade e a natureza pacífica faziam com que ele resistisse à proposta de Deus. O Senhor convida-o a não temer. A causa da sua objeção não era a idade, mas a angustia de ser mensageiro de Deus. Ser boca de Deus e proclamar sua palavra. Deus conserva aquele que chama em atitude de espera do acontecimento de sua palavra. É a palavra que dispõe do Profeta. Deus não nos fala para nos dar razão, mas para que voltemos a ele com confiança humilde. Quando o coração e a palavra humana recusam a Palavra de Deus já se entrou no ateísmo prático. Os profetas tornam-se como vento, e a locução divina não existe neles. Jeremias tornou-se Palavra de Javé. “Quando foram descobertas tuas palavras devorei-as, e tuas palavras foram para mim gozo e alegria do meu coração, pois teu nome foi invocado sobre mim” (Jer 15, 16).
O CHAMADO DE CRISTO
Há uma só vocação, que vem de Cristo, convocado e convocante. A vocação especifica-se, em vários graus correspondentes aos diversos momentos existenciais da experiência cristã. E estas experiências tem em Cristo sua fonte, seu sentido, sua referência e unidade.
A pessoa é convidada a escutar, e receber, colaborar com docilidade. Iniciar-se em Cristo é descobri-lo, deixar que ele nos encontre, recebê-lo. Deve haver uma conversão que é deixar-se alcançar, agarrar, incondicionalmente à pessoa, como ovelha extraviada, como uma dracma perdida, com um filho fugido (Lc 15).
É como um deixar-se encontrar qual tesouro no campo, qual pérola preciosa. A pessoa vende tudo, renuncia sua vida e recebe um novo ser. Descentrar-se de si mesmo, distanciar-se daquilo que até agora era segurança, o bem estar, o poder, o consumo e, ao mesmo tempo, entregar-se total e incondicionalmente a Cristo, nisso consiste a negação de si mesmo.
Jesus convida a segui-lo, cada um da própria situação em que se encontra.
Vinde comigo (Mc 1,17). Pede confiança nele (Mc 2,14). Confiança plena em sua pessoa e não a uma causa. A resposta obediente deve ser vivida no abandono do ligar do trabalho, do status, da casa, da família. Não se trata de adesão interna, mas de unir-se a ele em seu projeto de vida. Chama Doze para estarem com ele e para enviá-los a pregar. O centro da eleição é para que estivessem com ele. Não é pura adesão intelectual, mas adesão ao seu modo de viver. Os discípulos prolongam a presença e a obra de Jesus. Estar com Jesus é tão decisivo que somente assim é possível identificar-se com seu modo de viver, de atuar, de ser. Estas testemunhas devem ser pessoas livres, disponíveis, sem preocupação pela segurança material e pela proteção humana (Mc 6, 8-9). Disponibilidade. A Vocação é, pois, o modo insubstituível de viver a fé no Deus vivo, que nos ama.
Pe. Carlos Alberto Chiquim
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