segunda-feira, fevereiro 07, 2011

A vocação da Carmelita


É uma coisa que não pode causar estupor na leitura dos escritos de Santa Teresa de Lisieux o seu amor, o seu interesse, o seu respeito e estima pelos sacerdotes. Sente antes de tudo a necessidade da oração pelos sacedotes. Entre as várias experiências da sua viagem na Itália, houve aquela particular que diz respeito aos sacedotes: "Não tendo vivido na sua intimidade, não podia entender a finalidade principal da reforma do Carmelo. Orar pelos pecadores me atraia, mas orar pelas almas dos sacerdotes que eu cria mais puras que o cristal parecia-me surpreendente! Ah! Entendi a minha vocação na Itália e não foi preciso andar muito longe para um conhecimento tão útil. Por um mês vivi com muitos santos sacerdotes e vi que, se a dignidade os exalta acima dos anjos, eles são todavia homens débeis e frágeis... Se os santos sacerdotes que Jesus chama no Evangelho sal da terra mostram na sua conduta que têm uma grande necessidade das orações, o que dizer dos tíbios? Jesus não disse: "Se o sal torna-se insípido, com que salgaremos?" "Oh Madre! - continua a santa - Como é bela a vocação que tem por findalidade conservar o sal destinado às almas! É a vocação do Carmelo, porque o fim único das nossas orações e dos nossos sacrifícios é de ser apóstolo dos apóstolos, orando por eles, enquanto evangelizam as almas com as palavras e sobretudo com os exemplos (MA 157).

Teresa do Menino Jesus faz referência à finalidade da vocação carmelitana dada por Teresa de Jesus, a fundadora, como meta do Carmelo Descalço, quando para suas carmelitas escrevia no Caminho de Perfeição: "Quero fazê-las entender, irmãs, que nós devemos orar sem fim para que os bons cristãos que estão dentro da fortaleza não passe nenhum para o inimigo e para que o Senhor santifique os capitães da fortaleza e da cidade, que são os pregadores e os teólogos. E assim como a maior parte destes pertence às Ordens Religiosas, orai ainda para que alcancem a perfeição do seu estado. Isto é absolutamente indispensável. Podeis perguntar-me porque insisto tanto sobre este ponto e porque devemos ajudar aqueles que são melhores de nós (...) Os capitães devem viver com os homens, conversar com eles, entrar nos palácios, misturar-se nas conversações do mundo, e não obstante isto devem manter-se estranhos, inimigos do mundo, habitar aí como se fosse em um deserto, emfim, ser anjos e não homens? (...) Persuasa de que de santos prelados depende a nossa própria santidade, não esqueçamos jamais de lembrar-lhes ao Senhor, porque se trata de uma coisa muito importante. O dia em que as nossas orações, nossas penitências, nossos desejos e jejuns não fossem empregados nisto que disse, não alcançareis o fim para o qual o senhor vos reuniu aqui (Caminho 2,8,10).

"Vim para o Carmelo para salvar as almas, e sobretudo para orar pelos sacerdotes

Este pensamento a acompanhará também no seu ingresso no Carmelo e depois por toda a sua vida: "Aquilo que vim fazer no Carmelo, declarei-o aos pés de Jesus Hóstia, no exame que precedeu a minha profissão. Vim ao Carmelo para salvar as almas, e sobretudo para orar pelos sacerdotes" (M 195). À irmã Celina escrevia no mês de julho de 1889: "Ó minha cara Celina, vivamos pelas almas, salvemos sobretudo as almas dos sacerdotes. Estas almas deveriam ser mais transparentes que o cristal. Mas, ai de mim, quantos sacerdotes não são bastante santos... oremos, soframos por eles, e no último dia Jesus será nos será grato por isto. Nós lhe daremos almas... Celina, compreende o grito do meu coração" (Ct. 74). Em 1890 escreve à mesma Celina: "Celina cara, é sempre a mesma coisa que tenho a te dizer: oremos pelos sacerdotes... A cada dia nos damos conta de quão raros são os amigos de Jesus. Parece-me que seja isto o que mais o fere profundamente... a ingratidão, sobretudo o ver que almas a ele consagradas dão a outros aquele coração que lhe pertence de maneira absoluta. Se quiser poderemos converter as almas; é preciso que este ano façamos muitos sacerdotes amarem Jesus, que o toquem com as mesma delicadeza com a qual Maria o tocava na magedoura" (Ct. 102). Portanto Teresa tinha um conceito altíssimo da vocação sacerdotal: os sacerdotes devem ser anjos e não homens. A um certo momento também Celina quer entrar no Carmelo. Teresa defende a vocação daquelas que a deveriam acolher na comunidade: "Jesus nos defendeu na pessoa da Madalena. Era à mesa, Marta servia, Lázaro comia junto com Jesus e seus discípulos. Quanto a maria, não pensava em comer, mas em dar prazer àqueles que amava. Assim, tomou o vaso de alabastro cheio de perfume de grande valor e, tendo quebrado o vaso, o derramou sobre sua cabeça. Então toda a casa se encheu daquele perfume, mas os apóstolos murmuravam contra ela. A mesma coisa acontece conosco: os cristãos mais perfeitos, os sacerdotes, acham que somos exageradas, que deveríamos servir como Marta, ao invés de consagrar a Jesus os vasos das nossas vidas com os perfumes que estão aí dentro. Todavia, o que importa se os nossos vasos se quebrem, a partir do momento em que Jesus é consolado e o mundo levado a sentir os perfumes que exalam e que servem para purificar o ar envenenado que respiram?" (Ct 118).

Teresa, entre as várias vocações do seu coração sedento para doar-se a Deus e às almas, sente todas as vocações: de apóstolo, de mártir, de missionário, de guerreira, mas sente também a vocação do sacerdote. "Com que amor, Jesus, te levarei nas minhas mãos, quando, à minha voz, descereis do Céu! Com que amor te darei às almas!... (MA 251). Em São Paulo ela encontrará a realização da sua vocação no amor, "que abraça todas as vocações, porque o amor é tudo, e abraça todos os tempos e todos os lugares, em uma palavra é eterno!" (MA 254).


Em uma oração feita para suas noviças, Teresa assim dizia: "Senhor, temos necesssidade de almas! Especialmente de almas de apóstolos e mártires, a fim de que por meio deles, possamos inflamar do vosso amor a multidão dos pobres pecadores" (P. 8). Em uma composição poética sobre o pequeno mendicante do Natal, que é Jesus Menino, escreve, sonhando semeadores: "Lá em baixo, sob outros horizontes, não obstante as neves e os gelos, douram as messes que o Menino Jesus protege. Mas quais as almas ardentes seriam necessárias para colhê-las? Colhedores que não temem o ferro e o fogo, nem a vontade de sofrer. Eu venho ao Carmelo sabendo que os meus votos são também os teus: irmã, gera para o Salvador almas de apóstolos, multidões" (CP 15,12). Eis a finalidade: gerar para o Senhor almas de apóstolos: eis a sua vocação carmelitana.

Certamente chegavam ao Carmelo pedidos de oração neste sentido e o seu espírito delicado não podia não sofrer e por isso se empenhava ainda mais neste serviço. Formar sacerdotes santos, delicados com o Corpo do Senhor. Pode quase parecer uma obssessão para Teresa do Menino Jesus. Na sua conhecida poesia "Viver de Amor", Teresa, em um certo momento, explicando os vários significados do seu viver de amor, exprime também este: "Viver de amor, ó meu Divino Mestre, é suplicar-te para espandir os seus rais nas almas eleitas e santas dos sacerdotes, para que sejam mais que um celeste serafim, e protejam a tua Igreja imortal... (P. 9,10)

Entre outros sacerdotes presentes na vida de Santa Teresinha, dois se destacam. A santa tinha manifestado o prazer que seria ter um irmão sacerdote. Ela ganha dois, confiados às suas orações e ajuda espiritual. As toma como verdadeiros irmãos. E como é agradecida a Jesus por isto: "Jesus meu, vos agradeço por satisfazer-me em um dos mais grandes desejos: o de ter um irmão sacerdote e apóstolo: sou indigna de tanto favor" (P.11). Na sua autobiografia Teresa descreve longamente os caminhos do Senhor para fazê-la irmã de dois sacerdotes missionários. A convite da Priora de tomar-lhe como seus irmãos espirituais, a santa aceita e escreve: "Madre minha, dizê-la da minha felicidade seria algo impossível, o meu desejo satisfeito de modo inesperado me fez nascer no coração uma alegria infantil, porque devo voltar no tempo da minha infância para encontrar a recordação daquelas alegrias tão vivas que a alma torna-se pequena para contê-las" (MC 330).

O primeiro filho espiritual da santa foi Maruício Bartolomeu Bellière, aspirante missionário que no dia 29 de setembro de 1897, às vésperas da morte da santa, embarcava para a Algéria para entrar no noviciado dos Padres Brancos. Depois de alguns anos de missão na África, apareceu-lhe a doença do sono, e voltou para a França onde morreu em 1907, aos 33 anos.

O outro irmão missionário foi entregue aos cuidados de Teresa no mês de maio de 1896. Trata-se de Adolfo Giovanni Luigi Eugenio Roulland, das Missões estrangeiras de Paris, que foi ordenado sacerdote no mês seguinte e partiu no dia 2 de agosto daquele ano para a China.Em 1909 retornou à França, assumiu diversos cargos e morreu em 1934. Teresa tentou rejeitar o segundo irmão missionário porque já empenhada nas orações pelo primeiro. A Priora foi irremovível. "O zelo de uma Carmelita deve abraçar o mundo" recordou-lhe a Madre. Santa Teresinha pensava então "de poder ser útil a mais de dois missionários, e não podia esquecer de orar por todos, sem esquecer-se dos simples sacerdotes, cuja missão às vezes é tão difícil quanto aquela dos apóstolos que pregaram aos infiéis" (MC 333). Assim a santa conclui seu relato: "Eis como fui unida espiritualmente aos apóstolos que Jesus me deu como irmãos: tudo o que me pertence, pertence a cada um deles".

A partir daí Teresa coloca-se em correspondência epistolar com os dois sacerdotes e futuros missionários. As suas cartas são de uma profunda espiritualidade dificilmente encontrável em outros lugares. Não só se abre com eles, mas explica a eles os seus sentimentos sobre a bondade e a misericórdia divina, sobre a confiança nas quedas, sobre a eficácia da oração, sobre o amor que une aos dois. A santa busca sustentá-los nas dificuldades e os ajuda com todos os meios consentidos à sua condição de Carmelita. Vejamos algumas expressões mais significativas.

Ao P. Roulland diz, desde o início, que preparará para ele o corporal e um purificador com uma pala para que tivesse o prazer de enviar-lhe no dia da sua ordenação. E diz: "Suplico-lhe, reverendo Padre, peça a Jesus por mim no dia no qual se dignará descer pela primeira vez do céu chamado pela tua voz, peça-lhe de inflamar-me com o fogo do seu amor, para que eu possa depois ajudá-lo a descer até os corações. Faz tempo eu desejava conhecer um apóstolo que fosse contente de pronunciar o meu nome no santo altar, no dia da sua primeira Missa. Desejava preparar-lhe eu mesma as alfaias sagradas e a cândida hóstia destinada a esconder sob o véu o Rei dos reis. Este Deus de bondade quis realizar o meu sonho e mostrar-me uma vez mais o quanto é pronto a alegrar as almas que não buscam outro que Ele. Quando o oceano o separar da França, recordar-se-á, olhando a pala que eu pintei com tanta alegria, que sobre o Monte Carmelo uma alma ora sem cessar ao divino Prisioneiro do amor pelo sucesso da sua gloriosa conquista". E conclui a primeira carta ao irmão missionário com um desejo: "Desejo, Reverendo padre, que a nossa união apostólica não seja conhecida por ninguém, a não ser Jesus...".

Teresa, assim, vive a missão da carmelita: de oferecer suas orações e sacrifícios escondidos pelas almas expostas às dificuldades de quem está na primeira fila do apostolado da Igreja: solidão, desencorajamento, incerteza e incompreensão. Toda a correspondência com o Pare Roulland, bastante numerosa, vai nesta linha. Menos numerosas são as cartas com o Clérigo Bellière: mas a ele será particularmente próxima durante a crise vocacional que o tomou durante o serviço militar: crise felizmente superada, como demonstra a sua ordenação sacerdotal, o seu ingresso entre os Padres Brancos e o seu breve apostolado na África, do qual teve que distanciar-se por causa da doença.

Viver pelos sacerdotes, estes homens de Deus que têm a Missão de tornar o Cristo presente em sua Igreja, eis um ponto fundamental na vocação da Carmelita. Unidas a eles, como Santa Teresinha, elas serão missionárias e apostólicas, porque plenamente convictas da grandeza da vocação sacerdotal e do bem que faz o testemunho de uma vida santa, às almas confiadas aos sacerdotes. Vida que é dom de Deus e Graça inteiramente sua, humildemente implorada na oração e pelo sacrifício e imolação de Teresa e suas filhas, de Teresinha e suas irmãs.

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