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domingo, outubro 03, 2010



Mosteiro Beneditino Calmadolense

A vida cotidiana dos monges se desdobra ao redor de alguns eixos fundamentais, que uma  secular tradição de sabedoria espiritual tem elaborado, a partir da experiência vivenciada por inúmeros homens e mulheres que dedicaram a própria vida ao Senhor e ao serviço do próximo.

O estilo da vida monástica beneditina e camaldolense é marcado pela virtude da “discrição/discernimento/medida”, como destaca São Gregório Magno, o grande biógrafo e  intérprete  de São Bento. O intuito da Regra e da organização do dia é levar  o monge a construir  sua vida totalmente orientada ao Senhor, purificando seu coração e  unificando nele suas energias vitais, à medida que cresce a  experiência da força transformadora do amor no Espírito Santo. Com isso cresce a  autêntica liberdade interior e a recíproca relação na caridade..

Eis alguns dos principais elementos desta cotidiana construção da pessoa e da comunidade monástica. Eles animam o movimento interior e marcam o ritmo do dia, como demonstração da irradiação do carisma monástico e da sua  contribuição à evangelização da Igreja.

- estudo e meditação perseverante da Palavra de Deus (lectio divina),  em  clima de silêncio, espírito de oração  e humildade;

- celebração do mistério pascal de Cristo na liturgia eucarística e na  das horas;

- busca da obediência de fé ao Senhor, guiados pela sua Palavra, a Regra de São Bento, a tradição viva de São Romualdo e dos padres monásticos,  as orientações do magistério da igreja  e a reflexão teológica da comunidade cristã, o ministério de animação e de comunhão do Prior, em espírito  de  comunhão fraterna.

- trabalho manual e cultural, segundo as circunstâncias, executado em colaboração fraterna;

- acolhida de Cristo nos hóspedes, nos pobres e nos  necessitados de qualquer forma; 

- animação cultural e espiritual.

            O resultado de tudo isso é a criação de autêntico  espírito filial nas relações com o Senhor e  de sincero espírito fraternal entre os membros da comunidade que se abre ao mundo inteiro.
 1 – Espírito de oração filial e  primado do amor 
                          O Pai nos escolheu no Filho e nos predestinou a sermos filhos adotivos. Consagrados pelo Espírito Santo para formarmos um edifício espiritual  e um sacerdócio santo, somos chamados a fazer da nossa vida um sacrifício espiritual agradável  a Deus, por Jesus Cristo. Sendo assim aqueles  verdadeiros adoradores que o Pai procura (cf Jô 4,23), unidos nos sacramentos da igreja à oblação que o Cristo faz de si mesmo ao Pai, exercem em plenitude o seu caráter sacerdotal. Este culto espiritual, enquanto  tem seu centro na liturgia e na vida ascética, abraça todas as expressões da vida pessoal e comunitária.

             Participar a desta relação  de amor filial de Jesus para com o Pai, constitui a verdadeira escola na qual o monge aprende a  lei do “primado do amor”,  lei suprema de toda a vida monástica, e  sentido das  regras e sugestões ascéticas e espirituais. O primado do amor (privilegium amoris) foi  a marca que destacou a relação de  São Romualdo com seus discípulos, como mestre e como pai, e a marca que mais frisou o testemunho pessoal e o ensinamento de Don Benedetto Calati (1914- 2000), o Prior Geral que contribuiu de maneira tão profunda para a renovação espiritual e organizadora da congregação camaldolense,  depois do concílio Vaticano II. É a herança que queremos guardar  cuidadosamente para guiar o estilo da nossa  presença na igreja do Brasil.

            Eucaristia, Liturgia das horas, lectio divina, serviço na caridade, constituem o horizonte espiritual que alimenta o sentido filial  e fraternal da vida do monge camaldolense.
 2 – Celebração eucarística.
           
A  celebração eucarística, perene presença do mistério pascal de Cristo, é o centro da vida da comunidade. Dela a igreja nasce, dela continuamente vive e por ela cresce e se desenvolve até o encontro final com Cristo, seu esposo glorioso.

            Portanto, os monges vão procurando que a orientação espiritual da sua vida seja preparação e expansão da celebração da liturgia e de maneira especial, da eucaristia. Cuidam que  todos os membros recebam uma boa formação litúrgica  e que as celebrações se desenvolvam com um estilo simples e solene ao mesmo tempo, com respiração e ritmo contemplativo  que favoreça uma autêntica  participação ativa, interior e ritual.

            Favorecer tal participação ativa dos monges, dos hóspedes e do povo é um critério fundamental da espiritualidade e da ação pastoral da nossa comunidade. Por isso, a liturgia é celebrada em português, guardando ao mesmo tempo o ritmo contemplativo do antigo canto gregoriano do qual ressoam alguns dos mais significativos cantos, e oferecendo na homilia cotidiana, orientações para interiorizar a palavra e o mistério celebrado.
 3 – Liturgia das Horas
                        Na liturgia das horas a igreja oferece ao Pai o sacrifício de louvor e a ação de graças pela salvação em Cristo, dando voz à inteira família humana e à mesma criação que geme, na espera da plena libertação dos filhos de Deus.
          Como a liturgia das horas, conforme a tradição, pretende  santificar o curso do dia dando respiração interior, ao ritmo das obras do homem, a sua celebração dela é distribuída ao longo do dia com sapiente medida, alternando oração comunitária e trabalho.
Horário dos dias feriais
5h.30  Despertar
6h.00   Ofício das vigílias
6h.30  - 7h.30 Lectio divina
7h.30   Laudes
12h.15 Hora media
18h.15  Vésperas e Eucaristia
21h.00  Completas

Horário do Domingo e Festivo
Sábado
18h.00  Lectio divina partilhada em preparação ao Domingo
21h.00  Ofício das Vigílias

Domingo
7h.00  Despertar
7h.30  Laudes
11h.00 Solene Concelebração
18h.00 Vésperas

            A celebração das Laudes, das Vésperas e da eucaristia é partilhada todo dia, com  as co-irmãs monjas camaldolenses do Mosteiro da Encanação, assim como a Lectio divina do sábado.
 
4 – Lectio divina e oração particular
            A experiência de Deus vivida na celebração litúrgica, tem a necessária preparação e a natural expansão num empenho coerente de vida e no encontro contínuo com o Pai, cultivado no silêncio do coração e no contato com a sua Palavra, “alimento da alma, manancial puro e perene da vida espiritual”, como lembra o Concilio Vaticano II (DV 21).

            A tradição monástica tem considerado fundamental este encontro com a Palavra de Deus e tem feito dele a “lectio divina” por excelência. Ela abrange, em primeiro lugar a Sagrada Escritura, os padres da igreja, a tradição e a reflexão sempre viva na igreja, no intuito de conduzir o monge a uma inteligência cada vez mais profunda da Palavra divina e a uma  atuação mais plena da vontade salvífica  do Pai.

             A este mesmo objetivo aponta a formação geral  e a teológica do monge, em prol da sua vida pessoal e do serviço de animação  cultural e espiritual da comunidade na igreja. Tal formação é oferecida a  todos os candidatos à vida monástica, independentemente da   eventual vocação ao sacerdócio,  que deve ser reconhecida e promovida pela comunidade.

            Da  participação pessoal  à liturgia e da prática da lectio divina, desabrochará na alma do monge, sob o influxo do Espírito Santo, aquela oração secreta feita em compunção e pureza de coração, recomendada por São Bento, conforme ao preceito evangélico  (Mt 6,6).

            Compenetrada e fomentada pelo indispensável clima de silêncio em que Deus fala, praticada com fidelidade, esta oração deve ser para o monge um elemento constante da sua vida filial, além do horário comunitário, visando garantir  uma medida mínima e  indicando uma atitude permanente.

            Permanece fundamental, pelo monge camaldolense, o ensinamento do nosso santo pai Romualdo que entregou aos discípulos como herança preciosa, esta pérola de espiritualidade do oriente e do ocidente monástico, chamada por seu discípulo João “pequena regra de ouro”:

” Fica sentado na tua cela, como no paraíso.
Expele da memória o mundo inteiro e joga-o atrás de ti.
Fica vigilante e atento aos bons pensamentos
como um bom pescador aos peixes.
Única via, para tí, encontra-se nos Salmos.
Não deixá-la mais.

Se tu que és noviço não consegues entender tudo,
ora aqui  e ora lá, procura rezar os salmos 
com o coração  e entendê-los com a mente.
E quando na leitura começas a distrair-te,
não desanimes deixando de meditar,
mas esforça-te para voltar à atenção.
Antes de tudo, coloca-te na presença de Deus com atitude humilde,
como quem está na presença do imperador.

Esquece-te totalmente e fica aí
como uma criancinha,
contente só com a  graça de Deus.

Pois, se a mãe não dá, ela não tem de que comer,
e a comida mesma não tem sabor.”

(São Bruno Bonifácio, Vida dos cinco Irmãos, cap 19)

             Com profundo sentido de agradecimento ao Senhor  queremos lembrar  aos amigos brasileiros que  Don Cipriano Vagaggini (1909 – 1999), o grande liturgista que mais desenvolveu o “sentido teológico da liturgia” (título do seu mais conhecido livro traduzido nas principais línguas e  em 2008 também em português), e que tanto contribuiu  à renovação da liturgia   durante o Concílio Vaticano II, foi monge da nossa comunidade mãe de Camaldoli (Itália). Ele nos ensinou a redescobrir a centralidade da liturgia na vida da igreja, como sua fonte e seu cume,  e a unificar o processo da vida espiritual a partir da liturgia. Seu testemunho de fé inteligente e seu ensino teológico e espiritual  permanecem atuais mais do que nunca neste tempo de desvios superficiais, de polêmicas  e de busca de maior autenticidade da liturgia na vida do povo de Deus.
 5 -  Trabalho manual e trabalho intelectual
O trabalho, pelos monges como por todo ser humano, é constitutivo da sua vida cotidiana naquele sábio equilíbrio entre todas suas atividades, que a tradição beneditina tem simbolicamente resumido no lema “Ora et labora” (Oração e trabalho).

O trabalho em todas as suas dimensões, seja manual seja intelectual e espiritual, favorece a participação à obra criativa de Deus, ao desenvolvimento das atitudes de cada pessoa em solidariedade com a comunidade, e a participação nas suas necessidades e na vida dos necessitados.

O Horário da comunidade visa a favorecer este compromisso e este equilíbrio.

Nesta fase de re-estruturação da vida da nossa pequena comunidade, o trabalho manual principal dos monges é provisoriamente o de manutenção e de desenvolvimento dos edifícios e do meio  ambiente. A tradição beneditina nos solicita um estilo de vida  simples e o uso respeitoso das coisas e dos recursos naturais, como resposta à presença sagrada e humilde  de Deus neles, não menos de que na liturgia(cf RB ,3110). Para nós é razão  profunda  para nossa consciência ecológica, brotando daí  o nosso carinhoso cuidado pelo ambiente que circunda o Mosteiro e  pela criação inteira.

            O trabalho intelectual visa antes de tudo à formação dos candidatos e  à animação cultural e espiritual da igreja local de Mogi e das dioceses mais próximas, através do Centro de Estudos Litúrgicos (CESLI), do ensino da Liturgia e das línguas bíblicas na Faculdade  de Filosofia e Teologia Paulo VI,da hospitalidade de pessoas e grupos, e  várias iniciativas de formação espiritual dos leigos.

6 –Presença na igreja e Hospitalidade
Por força do próprio batismo, todos os discípulos de Jesus, e cada um segundo a própria vocação em comunhão com a Igreja, são chamados a participar também da sua missão de testemunho e irradiação do reino de Deus. Os monges não são exceção. Temos a consciência que a comunidade monástica cumpre eficazmente esta missão apostólica com a sua própria presença, com os valores que orientam a sua vida e frisam a busca de Deus como o critério absoluto.

A caridade que une os irmãos numa única família, o mistério de Cristo celebrado e vivido em coerência de vida, a Palavra de Deus ouvida e meditada diariamente, o colóquio orante que os une ao Pai, na ascese e na alegria do Espírito Santo, fazem da comunidade monástica uma proclamação da presença do Cristo na igreja e da espera do reino de Deus.

Vivendo  e colaborando na vida da comunidade, conforme o próprio compromisso e os dons recebidos do Espírito Santo, os monges, assim,   participam da obra apostólica da igreja. A ela não ficam alheios, nem aqueles que, por vocação especial, vivem uma vida de total dedicação ao Senhor na solidão, em contínua oração e intensa penitência, no vinculo de uma misteriosa fecundidade apostólica que os une ao corpo de Cristo. A tradição camaldolense chama estes irmãos, “reclusos”, separados dos outros pelo estilo de vida solitário, mas inseridos na comunhão da comunidade  e na obediência ao Prior.

            A hospitalidade dos monges é um jeito de ser,  antes de constituir um serviço  de caridade. Exprime a  experiência de ser amado  pelo próprio Pai  e acolhido na sua casa. Esta consciência faz enxergar em cada hóspede  o próprio Cristo:”todos os hóspedes que chegarem ao mosteiro sejam recebidos como o Cristo, pois ele próprio irá dizer: fui hóspede e me recebestes” (RB 53,1).

            A hospitalidade  é a forma mais tradicional da presença dos monges  camaldolenses  na sociedade. Ela tenciona não só oferecer alivio material aos que visitam a comunidade, mas também proporcionar a eles o alimento espiritual na comunhão da caridade e no encontro com a palavra de Deus. Aos hóspedes, homens e mulheres, a comunidade oferece quartos individuais com alfaia simples e essencial, um clima tranqüilo e silencioso que favorece a reflexão e a oração pessoal, a partilha da liturgia monástica e das refeições com a comunidade, a possibilidade de diálogo com  um monge  para  direção espiritual e  a celebração do sacramento da reconciliação.  O prazo  de estadia habitualmente  oferecido  a pessoas individuais  é  de uma semana.  Por grupos, um dia,  enquanto o Mosteiro ainda não dispõe de estruturas apropriadas. O mosteiro está circundado por um ambiente natural da Mata Atlântica muito lindo e tranqüilo,favorável ao descanso e  à meditação.

Para  marcar visitas e estadias  contatar  o responsável pela hospedaria, Don Emanuele.

No espírito de hospitalidade recíproca,  as comunidades camaldolenses, cada uma segundo as circunstâncias do próprio ambiente, promovem o  caminho ecumênico e o dialogo inter –religioso, para buscar juntos  a comunhão com o mesmo Senhor  que  nos transcende e nos ama e para promover a paz  e o recíproco respeito, nesta época em que  o nome de Deus é abusivamente usado para justificar violência e guerras.

Junto com as atividades de animação cultural acima mencionadas, o mosteiro promove  também um projeto de promoção social em prol de algumas  famílias mais pobres presentes na região: é o “Projeto São Bento”, realizado em parceria com a Cáritas diocesana de Mogi das Cruzes.

A pobreza mais emergente nesta região  da Grande São Paulo, é a espiritual. Muita gente, também entre os católicos que freqüentam as paróquias , tem escassa ou nenhuma formação para  viver com alegria o dom da fé, e enfrentar os desafios da sociedade secularizada ou dos vários grupos evangélicos.
Com seu estilo de vida, a liturgia aberta ao povo e a acolhida fraterna dos que pedem atenção e escuta, a pequena comunidade procura tornar-se um pequeno centro de irradiação do evangelho.
 8 -  Partilhando o carisma monástico: os oblatos/as
 Alguns leigos, desejando aprofundar a própria vida cristã, estão descobrindo na tradição espiritual monástica beneditina camaldolense um significativo ponto de referência para incrementar a própria formação e alimentar o próprio caminho espiritual.

O carisma da vida monástica, sendo constituído pelos valores fundamentais da vida cristã, pode ser participado e partilhado de maneiras diferentes, tornando-se fonte de inspiração de vários modelos de vida entre os monges/as e também para leigos e leigas. Assim um número crescente  de homens e mulheres, católicos e membros de outras confissões cristãs, estão descobrindo na Regra de São Bento e na pluralística tradição monástica, uma fecunda fonte de inspiração, e entram em relação fraterna com um ou outro mosteiro, encontrando nele, uma oportunidade concreta para responder à própria busca.
 São pessoas que “se dedicam” de maneira mais radical ao Senhor( é este o significado da palavra “oblato”!) seguindo a própria vocação de leigos e leigas empenhadas  cristamente  na família, na Igreja, nas atividades profissionais, etc, para realizar a vocação  universal e pessoal à santidade  recebida no batismo.

O Mosteiro da Transfiguração, a pedido de várias pessoas, tem iniciado o processo de formação e constituição de um grupo de “oblatos/as”.  O objetivo é  promover a formação espiritual  das pessoas, oferecer experiências de vida na comunidade, e chegar a um conhecimento e a uma interiorização da tradição espiritual beneditina camaldolense que possa alimentar as suas vidas. O programa, adaptado às situações de cada pessoa, prevê um período  de formação inicial com encontros sobre  sagrada escritura,  lectio divina, liturgia, Regra de São Bento e introdução aos ensinamentos  espirituais dos padres do monaquismo e à tradição de São Romualdo e de Camaldoli, reflexão sobre os maiores desafios da vida cristã de hoje na linha de renovação do concílio vaticano II..

A lectio divina cotidiana, a participação freqüente à missa, a celebração de alguma parte da Liturgia das horas, um estilo de vida simples e solidario na caridade, tornam-se gradualmente pilares da própria vida cristã, inspirada pela espiritualidade monástica. Na partilha da mesma fé e busca do Senhor  e na recíproca escuta, monges e oblatos acabam enriquecendo-se reciprocamente.
Ao fim do período de formação inicial, o oblato/a assume formalmente o empenho da oblação perante à  comunidade  e apresentando ao prior seu projeto de vida para ser por ele abençoado.

A caminhada prossegue, através do processo de formação permanente e da partilha com a comunidade.

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