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sexta-feira, agosto 20, 2010

Dos Sermões sobre o Cântico dos Cânticos, de São Bernardo, abade

(Sermo 83,4-6: Opera omnia, Edit. Cisterc. 2[1958], 300-302)

Séc.XII

Amo porque amo, amo para amar

O amor basta-se a si mesmo, em si e por sua causa encontra satisfação. É seu mérito, seu

próprio prêmio. Além de si mesmo, o amor não exige motivo nem fruto. Seu fruto é o próprio

ato de amar. Amo porque amo, amo para amar. Grande coisa é o amor, contanto que vá a seu

princípio, volte à sua origem, mergulhe em sua fonte, sempre beba donde corre sem cessar. De

todos os movimentos da alma, sentidos e afeições, o amor é o único com que pode a criatura,

embora não condignamente, responder ao Criador e, por sua vez, dar-lhe outro tanto. Pois

quando Deus ama não quer outra coisa senão ser amado, já que ama para ser amado; porque

bem sabe que serão felizes pelo amor aqueles que o amarem.

O amor do Esposo, ou melhor, o Esposo-Amor somente procura a resposta do amor e a

fidelidade. Seja permitido à amada corresponder ao amor! Por que a esposa e esposa do Amor

não deveria amar? Por que não seria amado o Amor?

É justo que, renunciando a todos os outros sentimentos, única e totalmente se entregue ao amor,

aquela que há de corresponder a ele, pagando amor com amor. Pois mesmo que se esgote toda

no amor, que é isto diante da perene corrente do amor do outro? Certamente não corre com

igual abundância o caudal do amante e do Amor, da alma e do Verbo, da esposa e do Esposo,

do Criador e da criatura; há entre eles a mesma diferença que entre o sedento e a fonte.

E então? Desaparecerá por isto e se esvaziará de todo a promessa da desposada, o desejo que

suspira, o ardor da que a ama, a confiança da que ousa, já que não pode de igual para igual

correr com o gigante, rivalizar a doçura com o mel, a brandura com o cordeiro, a alvura com o

lírio, a claridade com o sol, a caridade com aquele que é a caridade?Não. Mesmo amando

menos, por ser menor, se a criatura amar com tudo o que é, haverá de dar tudo. Por esta razão,

amar assim é unir-se em matrimônio, porque não pode amar deste modo e ser menos amada, de

sorte que no consenso dos dois haja íntegro e perfeito casamento. A não ser que alguém duvide

ser amado primeiro e muito mais pelo Verbo.

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