segunda-feira, dezembro 05, 2011

Do Tratado “A subida do Monte Carmelo”, de São João da Cruz, presbítero

Deus nos falou pelo Cristo
 
O motivo principal por que na antiga Lei eram lícitas as perguntas feitas a Deus, e convinha aos profetas e sacerdotes desejarem visões e revelações divinas, era não estar ainda bem fundada a fé nem estabelecida a Lei evangélica. Era assim necessário que se interrogasse a Deus e ele respondesse, ora por palavras, ora por visões e revelações, ora por meio de figuras e símbolos ou finalmente por muitas outras maneiras de expressão. Porque tudo o que respondia, falava e revelava, eram mistérios da nossa fé ou verdades que a ela se referiam ou a ela conduziam.

Agora, já estando firmada a fé em Cristo e promulgada a Lei evangélica nesta era de graça, não há mais razão para perguntar a Deus, daquele modo, nem para que ele responda como antigamente. Ao dar-nos, como nos deu, o seu Filho, que é a sua única Palavra (e não há outra), disse-nos tudo de uma vez nessa Palavra e nada mais tem a dizer.

É este o sentido do texto em que São Paulo busca persuadir os hebreus a se afastarem daqueles primitivos modos de tratar com Deus, previstos na lei de Moisés, e a fixarem os olhos unicamente em Cristo, dizendo: Muitas vezes e de muitos modos falou Deus outrora aos nossos pais, pelos profetas; nestes dias, que são os últimos, ele nos falou por meio de seu Filho (Hb 1,1-2). Por estas palavras o Apóstolo dá a entender que Deus emudeceu, por assim dizer, e nada mais tem a falar, pois o que antes dizia em parte aos profetas, agora nos revelou no todo, dando-nos o Tudo, que é o seu Filho.

Se agora, portanto, alguém quisesse interrogar a Deus, ou pedir-lhe alguma visão ou revelação, faria injúria a Deus não pondo os olhos totalmente em Cristo, sem querer outra coisa ou novidade alguma. Deus poderia responder-lhe deste modo: Este é o meu Filho amado, no qual eu pus todo o meu agrado. Escutai-o! (Mt 17,5). Já te disse todas as coisas em minha Palavra. Põe os olhos unicamente nele, pois nele tudo disse e revelei, e encontrarás ainda mais do que pedes e desejas.

Desde o dia em que, no Tabor, desci com meu Espírito sobre ele, dizendo: Este é o meu Filho amado, no qual eu pus todo o meu agrado. Escutai-o!, aboli todas as antigas maneiras de ensinamento e resposta. Se falava antes, era para prometer o Cristo; se me interrogavam, eram perguntas relacionadas com o pedido e a esperança da vinda do Cristo, no qual haviam de encontrar todo o bem – como agora o demonstra toda a doutrina dos evangelhos e dos apóstolos.

Dos Comentários sobre o Profeta Isaías, de Eusébio de Cesaréia, bispo

Uma voz clama no deserto


Uma voz clama no deserto:Preparai o caminho do Senhor, aplainai a estrada de nosso DeusÓ (Is 40,3). O profeta afirma claramente que não será em Jerusalém, mas no deserto que se realizará esta profecia, isto é, a manifestação da glória do Senhor e o anúncio da salvação de Deus para toda a humanidade.


Na verdade, tudo isto se realizou literalmente na história, quando João Batista anunciou no deserto do Jordão a vinda salvífica de Deus e ali se revelou a salvação de Deus. De fato, Cristo manifestou-se a todos em sua glória quando, depois de seu batismo, os céus se abriram e o Espírito Santo, descendo em forma de pomba, pousou sobre ele; e a voz do Pai se fez ouvir, dando testemunho do Filho: Este é o meu Filho amado, escutai-o (Mt 17,5).


Estas coisas foram ditas porque Deus deveria vir ao deserto, desde sempre fechado e inacessível. Com efeito, todas as nações pagãs estavam privadas do conhecimento de Deus, e os homens justos e os profetas de Deus nunca haviam penetrado nelas.


Por este motivo, a voz ordena que se prepare um caminho para a Palavra de Deus e se aplainem os terrenos escarpados e ásperos, a fim de que o nosso Deus possa entrar quando vier. Preparai o caminho do Senhor (Mc 1,3): é esta a pregação evangélica que traz um novo consolo e deseja ardentemente que o anúncio da salvação de Deus chegue a todos os homens.


Sobe a um alto monte, tu, que trazes a boa-nova a Sião. Levanta com força a voz, tu, que trazes a boa-nova a Jerusalém (Is 40,9). Depois que se mencionou a voz que clama no deserto, convêm perfeitamente estas palavras, que se referem aos evangelistas e anunciam a vinda de Deus entre os homens. De fato, a alusão aos evangelistas devia logicamente seguir a profecia sobre João Batista.

Que Sião é esta, senão a que antes se chamava Jerusalém? Era realmente um monte, como declara esta palavra da Escritura: O monte Sião que escolhestes para morada (Sl 73,2). E o Apóstolo: Vós vos aproximastes do monte de Sião (Hb 12,22). Não será uma alusão ao grupo dos apóstolos, escolhido entre o antigo povo da circuncisão?


Tal é, pois, Sião ou Jerusalém, que recebeu a salvação de Deus, e que foi edificada sobre o monte de Deus, isto é, sobre o Verbo, seu Filho único. A ela, que subiu ao alto monte, é que Deus ordena anunciar a palavra da salvação. Mas quem anuncia a boa-nova, senão o coro dos evangelistas? E o que significa anunciar a boa-nova? É proclamar a todos os homens, e em primeiro lugar às cidades de Judá, a vinda de Cristo à terra.